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ICMS: Transferência de bens entre estabelecimentos do mesmo contribuinte
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ICMS: Transferência de bens entre estabelecimentos do mesmo contribuinte

Posicionamento atualizado do Judiciário, inclusive acerca da manutenção do crédito do ICMS.

O ICMS na transferência é um dos temas mais relevantes na atualidade, inclusive em razão dos reflexos econômicos e estruturais.

O cerne da questão, basicamente, se refere ao questionamento levado à efeito no judiciário acerca da não tributação na mera transferência de bens entre estabelecimentos do mesmo contribuinte.

Os Estados pontuam acerca da suposta tributação, amparados pela tese da “autonomia dos estabelecimentos”, a qual implica na tributação do ICMS nas mencionadas transferências.

O judiciário, por sua vez, refuta diametralmente ao referido entendimento, inclusive o posicionamento é pacífico, dos quais se destacam a Súmula nº166, do Superior Tribunal de Justiça, a saber: “Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte”.

O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, detém posicionamento contemporâneo, por meio da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 49, a qual ratifica a não incidência do ICMS em operações de transferência visto a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 11, parágrafo 3º, inciso II[1], 12, inciso I, no trecho “ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular”[2], e 13, parágrafo 4º[3], todos da Lei Complementar 87/1996.

Ainda em relação a ADC nº 49, importante mencionar que o julgamento da referida ação ainda pende de análise perante a Corte Suprema. Inclusive, há pedido de modulação de efeitos (aplicação de limites à eficácia temporal dos efeitos). Nesse caso, por meio do voto-vista do Ministro Dias Toffoli, o recurso (embargos de declaração) foi acolhido com a indicação da aplicação de modulação após o prazo de 18 (dezoito) meses, contados da data de publicação da ata de julgamento dos presentes embargos de declaração, ficando ressalvadas as ações judiciais propostas até a data de publicação da ata de julgamento do mérito. O Ministro Nunes Marques pediu vista e deve apresentar considerações específicas sobre o caso.

Sobre a ação em trâmite no STF

Sendo assim, a referida ação que tramita no Supremo Tribunal Federal pende de julgamento e, ainda que seja e tenha ótimo precedente, não foi finalizada. Esse é o argumento utilizado pelos Estados para refutar a aplicação do referido precedente.

Inclusive, o Estados de São Paulo se posicionou recentemente, a saber:

São Paulo – Solução de Consulta nº25513/2022

ICMS – Transferência de mercadorias entre estabelecimentos pertencentes ao mesmo titular – Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 49 (ADC 49).

I. Enquanto não proferida a decisão final referente aos embargos de declaração interpostos em razão de omissões decorrentes do teor da decisão proferida na ADC 49 e, tendo em vista a legislação vigente do imposto (Lei Complementar nº 87/1996, Lei Estadual nº 6.374/1989 e RICMS/2000) e a natureza vinculada da atividade fiscalizatória, entende-se que permanecem aplicáveis as atuais disposições legais condicionantes ao correto aproveitamento do crédito nas transferências entre estabelecimentos pertencentes ao mesmo titular.

O cenário narrado acima gera incertezas aos contribuintes de ICMS, visto já ter posição mais do que consolidada no judiciário e, por outra via, permanecem à mercê dos Estados na cobrança indevida do ICMS na transferência entre estabelecimentos.

Quais são as alternativas possíveis às empresas?

Restou, como alternativa saudável às empresas, a judicialização do tema para imprimir maior segurança, sendo certo que há respaldo robusto para a não tributação do ICMS nos meros deslocamentos.

Ainda acerca de eventual questionamento no judiciário, importante a discussão para manutenção dos créditos de ICMS nas aquisições referente às operações devidamente tributadas.

Isso porque, conforme já mencionado, os Estados possuem análise restritiva e da aplicação do referido entendimento e, inclusive, indicam que caso o contribuinte obtenha e aplique a decisão judicial, deve realizar o estorno do crédito de ICMS.

Sobre a posição dos contribuintes

A posição dos contribuintes, por sua vez, refuta veementemente sob a perspectiva constitucional do princípio da não-cumulatividade, estampado no artigo 155, inciso II, parágrafo 2º, a saber:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (…)

II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; (…)

§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

I – será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal; (g.n.)

O argumento dos contribuintes para manutenção do crédito de ICMS é inequívoco visto (i) o respeito a não cumulatividade tributária, mandatória ao tributo em comento; e (ii)  deve ser mantido o creditamento das operações de entradas tributadas visto que haverá a tributação do ICMS quando ocorrer a devida operação de mercancia (saída), logo, não há respaldo constitucional para estornar o crédito devidamente apropriado pelos contribuintes quando das aquisições de insumos ao processo produtivo, por exemplo.

Sobre o entendimento do judiciário

O entendimento é confirmado pelo judiciário de forma assertiva, inclusive, o posicionamento do Tribunal Estaduais, das quais destaca-se a recente decisão no Paraná, a saber:

MANDADO DE SEGURANÇA. OPERAÇÃO DE TRANSFERÊNCIA INTERESTADUAL DE MERCADORIAS ENTRE MATRIZ E FILIAL. O MERO DESLOCAMENTO DE MERCADORIAS ENTRE ESTABELECIMENTOS DO MESMO CONTRIBUINTE NÃO GERA A INCIDÊNCIA DO ICMS. INEXISTÊNCIA DE CIRCULAÇÃO JURÍDICA DE MERCADORIAS.SÚMULA 166 DO STJ: “NÃO CONSTITUI FATO GERADOR DO ICMS O SIMPLES DESLOCAMENTO DE MERCADORIA DE UM PARA OUTRO ESTABELECIMENTO DO MESMO CONTRIBUINTE.”.

ENTENDIMENTO CONSUBSTANCIADO PELO STF AINDA, NA ADC 49. APLICAÇÃO DAS DECISÕES DECORRENTES DO CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE A PARTIR DA PUBLICAÇÃO DA ATA DE JULGAMENTO.

POSSIBILIDADE DE MANUTENÇÃO DOS CRÉDITOS DECORRENTES DA ENTRADA DE MERCADORIAS, POSTERIORMENTE DESTINADAS À TERCEIROS. CONSEQUÊNCIA DA NÃO-CUMULATIVIDADE.

SEGURANÇA CONCEDIDA. (G.N.)

A conclusão levada a efeito pela jurisprudência guarda total relação com o princípio constitucional da não-cumulatividade em especial considerando o fato de que, ao final, a mercadoria será efetivamente tributada. O não creditamento ou estorno ocasionará (além da inconstitucionalidade), ainda, no acúmulo da carga tributária, a qual será refletida (aumento) no valor da operação.

Portanto, inequívoco o respaldo jurídico da discussão acerca da não tributação das meras transferências entre estabelecimentos do mesmo contribuinte (matriz e filiais), sendo necessário a tratativa acerca da manutenção dos créditos de ICMS visto o respeito aos corolários constitucionais.

Thiago Glucksmann

Diretor de Tax Planning na BMS Consultoria Tributária

Advogado e Professor.


[1] Art. 11. O local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável, é: (…)

§ 3º Para efeito desta Lei Complementar, estabelecimento é o local, privado ou público, edificado ou não, próprio ou de terceiro, onde pessoas físicas ou jurídicas exerçam suas atividades em caráter temporário ou permanente, bem como onde se encontrem armazenadas mercadorias, observado, ainda, o seguinte: (…)

II – é autônomo cada estabelecimento do mesmo titular;

[2] Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:

I – da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;

[3]   Art. 13. A base de cálculo do imposto é:

§ 4º Na saída de mercadoria para estabelecimento localizado em outro Estado, pertencente ao mesmo titular, a base de cálculo do imposto é:

I – o valor correspondente à entrada mais recente da mercadoria;

II – o custo da mercadoria produzida, assim entendida a soma do custo da matéria-prima, material secundário, mão-de-obra e acondicionamento;

III – tratando-se de mercadorias não industrializadas, o seu preço corrente no mercado atacadista do estabelecimento remetente.

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