Thiago Glucksmann
Inequívoco o respaldo jurídico da discussão acerca da não tributação das meras transferências entre estabelecimentos do mesmo contribuinte (matriz e filiais), sendo necessário a tratativa acerca da manutenção dos créditos de ICMS, considerando o respeito aos corolários constitucionais.
O ICMS na transferência é um dos temas mais relevantes na atualidade, inclusive em razão dos reflexos econômicos e estruturais. O que está sendo discutido, no caso, é o questionamento levado a efeito no Judiciário sobre a não tributação na mera transferência de bens entre estabelecimentos do mesmo contribuinte.
Os Estados pontuam sobre a suposta tributação, amparados pela tese da “autonomia dos estabelecimentos”, que implica na tributação do ICMS nas mencionadas transferências.
O Judiciário, por sua vez, refuta este entendimento, inclusive o posicionamento é pacífico, dos quais se destacam a Súmula nº166, do Superior Tribunal de Justiça, a saber: “Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte.”. O Supremo Tribunal Federal detém decisão contemporânea sobre o assunto, por meio da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 49, a qual ratifica a não incidência do ICMS em operações de transferência tendo em vista a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 11, parágrafo 3º, inciso II, 12, inciso I, no trecho “ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular”, e 13, parágrafo 4º, todos da Lei Complementar 87/96.
Ainda em relação à ADC 49, importante mencionar que o julgamento da referida ação ainda pende de análise perante a Corte Suprema. Há, inclusive, pedido de modulação de efeitos. Nesse caso, por meio do voto-vista do Ministro Dias Toffoli, o recurso (embargos de declaração) foi acolhido com a indicação da aplicação de modulação após o prazo de 18 meses, contados da data de publicação da ata de julgamento dos presentes embargos de declaração, ficando ressalvadas as ações judiciais propostas até a data de publicação do julgamento do mérito. O Ministro Nunes Marques pediu vista e deve apresentar considerações específicas sobre o caso.
Sendo assim, a referida ação que tramita no Supremo Tribunal Federal pende de julgamento e, ainda que seja e tenha ótimo precedente, não foi finalizada. Esse é o argumento utilizado pelos Estados para refutar a aplicação do referido precedente. O Estado de São Paulo se posicionou recentemente, por meio da Solução de Consulta 25513/22, com a indicação de que “permanecem aplicáveis as atuais disposições legais condicionantes ao correto aproveitamento do crédito nas transferências entre estabelecimentos pertencentes ao mesmo titular.”
O cenário narrado acima gera incertezas aos contribuintes de ICMS, visto já ter posição mais do que consolidada no Judiciário e, por outra via, permanecem à mercê dos Estados na cobrança indevida do ICMS na transferência entre estabelecimentos.
Restou, como alternativa saudável às empresas a judicialização do tema, para imprimir maior segurança, sendo certo que há respaldo robusto para a não tributação do ICMS nos meros deslocamentos.
Ainda acerca de eventual questionamento no Judiciário, importante a discussão para manutenção dos créditos de ICMS nas aquisições referentes às operações devidamente tributadas.
Isso porque, conforme já mencionado, os Estados possuem análise restritiva e da aplicação do referido entendimento, e indicam que caso o contribuinte obtenha e aplique a decisão judicial, deve realizar o estorno do crédito de ICMS.
A posição dos contribuintes, por seu lado, se contrapõe sob a perspectiva constitucional do princípio da não-cumulatividade, estampado no artigo 155, inciso II, parágrafo 2º.
O argumento dos contribuintes para manutenção do crédito de ICMS é inequívoco, visto (i) o respeito à não cumulatividade tributária, mandatória ao tributo em comento; e (ii) deve ser mantido o creditamento das operações de entradas tributadas, visto que haverá a tributação do ICMS quando ocorrer a devida operação de mercancia (saída). Logo, não há respaldo constitucional para estornar o crédito devidamente apropriado pelos contribuintes quando das aquisições de insumos ao processo produtivo, por exemplo.
O entendimento é confirmado pelo Judiciário de forma assertiva, inclusive, o posicionamento dos Tribunais Estaduais.
A conclusão levada a efeito pela jurisprudência guarda total relação com o princípio constitucional da não-cumulatividade, em especial considerando o fato de que, ao final, a mercadoria será efetivamente tributada. Logo, inequívoco o respaldo jurídico da discussão acerca da não tributação das meras transferências entre estabelecimentos do mesmo contribuinte (matriz e filiais), sendo necessário a tratativa acerca da manutenção dos créditos de ICMS, considerando o respeito aos corolários constitucionais.